RELOAD

Após mais de um ano fora do ar ou simplesmente desatualizado, resolvi fazer um RELOAD do "Concepções e Conjunturas". Buscando alternar a proposta entre artigos, notícias e sempre algumas concepções e na busca pela praticidade do assunto central que motivou a criação do blog: discutir e comprender um pouco de economia. Nesta ótica, darei início hoje a uma série de publicações de vídeos explicando e sistematizando conceitos econômicos. Vídeos estes que podem ser encontrados disponíveis em diversos sites e portais, estarão agora também disponíveis em "Concepções e Conjunturas"! Sempre, é claro, divulgando a fonte para não roubar os direitos autorais de ninguém.

terça-feira, 31 de março de 2009

Revelando a Demanda Real Brasileira

O avanço da exclusão social no desenho urbano de nossas grandes metrópoles é algo já conhecido por muitos dentro e fora do Brasil. E que infelizmente avança de forma arrasadora, afinal de contas, nos últimos anos deixou de ser algo específico da concentração urbana em grandes cidades, mas caminhando um pouco pelo interior do país veremos que esta realidade abrange municípios de todos os portes. Enfim, esta é uma realidade já bem conhecida por nós brasileiros e que buscamos diariamente possíveis soluções.

Por incrível que pareça, na última semana, fomos surpreendidos pela divulgação em tom de festa, feita pelo governo da elaboração de um plano de construção de 1 milhão de moradias populares em todo país. O objetivo principal seria subsidiar para as famílias de baixa renda o sonho da casa própria. Imediatamente, críticos em todo o país começaram a analisar até que ponto será real e efetivo o projeto, assim como até que ponto o mesmo está sendo mais uma jogada de marketing político para iniciar o ano eleitoral. Estão sendo questionados o cronograma temporal, a infra-estrutura inexistente que serrá necessária para servir de suporte as novas moradias, o orçamento também inexistente no caixa do governo entre outras coisas.

Porque falo da existência da surpresa diante da notícia. Nos últimos anos, vivenciamos um governo que em todo o tempo fez um marketing de um país fortalecido contra a atual crise, firmado na “igualdade” através de programas sociais. [Nada contra a execução dos programas sociais em andamento, pois são necessários]. Porém, pensando um pouco mais no cenário em questão, para mim uma coisa é certa, finalmente o governo revelou, mesmo que entre linhas, que tem consciência plena da imensidão da exclusão social no seio urbano do Brasil e o enorme déficit habitacional no país. Afinal, se planeja construir 1 milhão de moradias, é porque no mínimo existe 1 milhão de famílias que necessitam urgentemente de medidas de intervenção social.

Em um momento como este, onde o Estado revela ter consciência da real demanda de sua sociedade, é que nós cidadãos devemos agir de forma a buscar novas formas de regulação desta enorme desigualdade. Esta é raiz da proposta de uma economia solidária presente e ativa. Em que os projetos elaborados e executados vinculam-se exclusivamente no atendimento de necessidades vividas localmente pela sociedade. Diferente, do que busca suprir o mercado, através de sua especulação de auto-regulação entre demanda e oferta [a crise esta revelando que não é possível] ou um Estado “marketeiro”, que planeja superficialmente projetos para o bem-estar social, mas com o objetivo de se auto-promover politicamente deixando de lado o principal objetivo, a demanda da sociedade.

Enfim, estamos diante de mais uma oportunidade de convergir as articulações nas dimensões sociais, econômicas e políticas para trazer a realidade uma proposta visando saciar a demanda da sociedade. Se o governo assinalou com a luz verde, vamos levantar e fazer prevalecer os direitos de cidadão e regular a prática e execução deste projeto.

sexta-feira, 27 de março de 2009

"60 MIN. - HORA DO PLANETA"

Até hoje, mais de 370 cidades de 35 países já estão cadastradas no "Earth Hour", elas irão desligar as luzes durante uma hora este sábado, no âmbito da iniciativa (Hora da Terra), que visa alertar para as mudanças climáticas.

Na lista de participantes na iniciativa, lançada pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF) australiano, constam, entre outras, cidades de países como Espanha, Reino Unido, Argentina, Bolívia, Brasil, México, Uruguai, Venezuela, Canadá, Dinamarca, ilhas Fiji, Estados Unidos e Tailândia.

Abaixo segue o vídeo da campanha:


Eu vou participar e acho que todos devemos, aos poucos conseguimos gerar uma consciência coletiva sobre o assunto.

Para mais informações clique nos link's abaixo:


Earth Hour no Twitter

quinta-feira, 19 de março de 2009

Qual será o próximo tema?

Campanha realizada pelo PNUD, busca ouvir estudantes de todo o Brasil para encontrar a resposta a seguinte pergunta: "O que precisa melhorar no Brasil para sua vida melhorar de verdade?". O objetivo da campanha é definir o próximo tema do Relatório de Desenvolvimento Humano do Brasil.

Eu, particularmente, gostei muito da proposta e acredito que devemos mobilizar o máximo de estudantes para participarem desta campanha. Afinal de contas, este relatório tem servido como base e plataforma para os principais projetos desenvolvidos pelo governo federal, estadual e municipal e também por movimentos sociais e ONG's.

Por isso disponibilizei aqui no blog a matéria divulgada pelo PNUD com os principais links da campanha:

Estudantes vão opinar sobre tema de relatório do PNUD

"Alunos brasileiros vão ajudar a definir o tema do próximo Relatório de Desenvolvimento Humano, opinando sobre o que deve mudar no país"

DAYANNE SOUSA
da PrimaPagina

Alunos de escolas públicas e particulares de todo Brasil vão ajudar a escolher o tema do próximo Relatório de Desenvolvimento Humano brasileiro. Na semana entre 16 e 21 de março, eles serão incentivados a responder à pergunta: “O que precisa melhorar no Brasil para sua vida melhorar de verdade?”.  As respostas serão enviadas para a campanha Brasil Ponto a Ponto, do PNUD, que desde setembro do ano passado está coletando a opinião dos brasileiros sobre os principais problemas do país, para poder definir o assunto do próximo relatório. 

A iniciativa é uma forma de incentivar a participação de jovens e adolescentes na campanha. “Ela é aberta a todos e queremos ouvir pessoas de diferentes características”, diz Moema Freire, uma das coordenadoras da Brasil Ponto a Ponto. “A inclusão de jovens e crianças é importante porque são eles que vão construir o futuro do país e é uma forma de eles participarem da [construção da] cidadania”, completa.

A forma de participação das escolas ficará a critério de cada instituição, explica Moema. Elas poderão planejar atividades individuais ou discussões em grupos. “Queremos que os professores levem o tema para a sala de aula”, diz a coordenadora. “É possível gravar um vídeo para as crianças que ainda não sabem escrever”, exemplifica. Além de vídeos, as escolas podem enviar o trabalho dos estudantes em formato de texto, pela internet ou pelo correio. 

O PNUD pede que as instituições de ensino interessadas em participar enviem um e-mail para o endereço rdh@undp.org.br com o nome da escola, a cidade e a série dos alunos envolvidos na atividade, para que o órgão possa fazer um controle do número de entidades participantes. Mas o e-mail não é um pré-requisito para a participação, nem é preciso esperar uma resposta do PNUD para iniciar o trabalho. 

Uma parceria com o CONSED (Conselho Nacional de Secretários de Educação) já garantiu a participação de escolas públicas da rede estadual de pelo menos 18 Estados: todos os da região Sudeste, oito no Nordeste, quatro na região Norte, além de Santa Catarina e Mato Grosso do Sul. Nesses casos, a Secretaria de Educação estadual é que será responsável pela mobilização.

Mesmo depois do término da campanha nas escolas, os estudantes poderão continuar participando, assim como o restante da população, por meio do envio vídeos ou textos para o site da Brasil Ponto a Ponto. A consulta vai até 15 de abril.Depois, todo material será analisado e o tema mais abordado fará parte do relatório, que será publicado entre o fim de 2009 e o início de 2010."

PRINCIPAIS LINK's: 





sábado, 14 de março de 2009

Uma semana para estimular ou desanimar

Sempre ouvimos falar que no Brasil o ano só começa a funcionar depois do carnaval. Para alguns setores da economia esta afirmação pode ser verdadeira, para outros nem tanto. Enfim, não é esta a discussão que quero trazer aqui, mas que podemos sim afirmar que depois desta semana os planejamentos e programas econômicos do Brasil, tanto públicos quanto privados, ficaram mais sólidos e consistentes do que antes do carnaval, isso é verdade.

Tivemos uma semana intensa, o IBGE divulgou vários índices os quais conduziram a expectativa do mercado. PIB do último trimestre de 2008, projeção final de crescimento de 2008, expansão das indústrias em todo o país, balanço de volume e renda do comércio varejista. E não ficou só nisso, a OMC também divulgou um relatório dizendo que o crescimento econômico do Brasil será favorecido pela maior concorrência dos mercados. E por fim tivemos mais um reajuste do Copom na taxa de juros do país. Para muitos, a semana foi simplesmente o respaldo que esperavam para concretizar seus planejamentos e programas de curto, médio e longo prazo dentro e fora do país.

Começando pela OMC, que divulgou no dia 09/03, um relatório, dizendo que desde seu último exame no ano de 2004, o Brasil tem perseguido a modernização progressiva de seu regime comercial. Com medidas que visam favorecer a ampliação da concorrência de seu mercado com o respaldo de seu crescimento médio nos últimos anos. Concluindo, o relatório afirma que existe ainda alguns desafios chaves a serem rompidos, porém caso o Brasil consiga permanecer neste ritmo, sem dúvida irá melhorar o nível de vida de sua população e manter seu crescimento econômico.

No mesmo ritmo da semana foi a vez do IBGE começar a divulgar seus relatórios. No dia 10/03, divulgou de uma só vez, notícias boas e ruins. A notícia boa foi o fechamento do PIB anual que revelou um crescimento de 5,1% e também o aumento do PIB per capita de 4,0%. Em contrapartida, o resultado do último trimestre do ano de 2008 revelou um recuo no PIB de 3,6%, sendo o maior recuo da série inciada em 1996, deixando todos receosos de uma possível recessão .

Em outra notícia divulgada pelo IBGE, no mesmo dia, os índices de produção industrial avançaram em 8 dos 14 locais pesquisados no período entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009. Com destaque para “...Paraná(6,8%), Pernambuco (6,4%), Santa Catarina (5.0%) e Rio Grande do Sul (3,6%), onde o crescimento foi acima da média nacional (2,3%). Os demais locais com taxas positivas nesse confronto foram São Paulo (2,2%), Minas Gerais (2,1%) região Nordeste (2,0%) e Pará (1,1%). Entre as áreas que reduziram a produção destacaram-se, com as quedas mais elevadas, Amazonas (-5,5%) e Espírito Santo (-4,6%).”

E fechando a semana e seu ciclo de publicações o IBGE, revelou que o Comércio Varejista do país teve um crescimento tanto no volume quanto nas receitas. O volume de vendas cresceu cerca de 6,0% em relação a janeiro de 2008 e acumulou um crescimento de 8,7% nos últimos 12 meses. Assim como a receita nominal cresceu 11,9% acumulando um crescimento de 14,7% nos últimos 12 meses.

Por sua vez, na noite do dia 11/03, o Copom decidiu por unanimidade um corte de 1,5% na taxa básica de juros Selic, levando-a para 11,25% ao ano (nível semelhante ao de março de 2008). Esta foi a segunda redução da taxa seguida e o maior corte desde novembro de 2003. Todos agora estão com os olhos voltados para o reflexo desta decisão nos níveis de inflação do país. Logo após o corte divulgado pelo Copom, alguns bancos seguiram a decisão anunciando cortes também na taxa de juros ao consumidor.

Enfim, foi uma semana intensa para qualquer um no país, desde analistas e especialistas do setor econômico financeiro aos consumidores e cidadãos brasileiros que vivem diariamente com os reflexos dos números divulgados. Uma coisa ficou bem clara, a interrogação continua no ar: em meio a crise estas decisões são suficientes para assegurar a economia brasileira longe da recessão e no caminho do crescimento econômico? Vamos aguardar e continuar acompanhando o desenrolar do ano.

Por João Baptista – jbaptistamj@gmail.com -

quinta-feira, 12 de março de 2009

Por uma nova batalha do desenvolvimento


por Paul Caspersz


O conceito chave de desenvolvimento tornou-se uma miragem. Interpretado pelos organismos internacionais a certa distância das regras do mercado, confunde a evolução indispensável das sociedades e a reforma das infra-estruturas com a pesquisa do crescimento desenfreado. O desenvolvimento não é portanto mais aquele de todo o homem e de todos os homens que preconizou, entre outros, Louis-Joseph Lebret, mas uma ilusão carregada de fatais consequências. Como remediar? E sobretudo, como não abdicar a revindicação de um outro desenvolvimento? Paul Caspersz tenta dar esta resposta.

O tempo mostra a necessidade de redefinir o conceito de desenvolvimento e de ter uma compreensão clara do que designa este processo. O conceito dominante no decorrer dos anos 1990, promovido pelo Banco mundial e o Fundo monetário internacional, é o de crescimento econômico. As instituições foram impulsionadas, frequentemente com sucesso, as elites políticas e sociais do terceiro mundo, e até mesmo numerosas associações e militantes, a partilhar esse conceito e a sustentar o processo.

O problema é que o significado do desenvolvimento perdeu seu sentido. Quando um mesmo termo é utilizado frequentemente e sobre longos períodos por tantas pessoas e em vários locais, nós admitimos facilmente que ele foi utilizado corretamente. Ou na realidade longe de ser o caso. A hipótese conforme a qual todo mundo sabe no que consiste o verdadeiro desenvolvimento é gratuita e errônea.

Se emancipar da “casta” dos especialistas

A primeira coisa a se fazer, desde então, é encontrar um novo termo ou uma nova expressão para redefinir esse conceito depreciado. É necessário, para isto, ter coragem de se emancipar da linguagem da “casta” dos especialistas ocidentais das ciências sociais. O objetivo de vários teóricos ocidentais do desenvolvimento é mais de ser incluído por seus pares que pelos povos que eles estudam. Romper com a maneira de escrever destes especialistas, tomar a decisão de ser “fora casta”, é o primeiro passo que nos permite salvar o conceito e o processo de desenvolvimento.

Uma vez que tenha-se efetuado esse primeiro passo, nós devemos ter a coragem de nomear este estragado, o conceito atualmente difundido de “desenvolvimento”. Este veneno, é o dinheiro, sua supremacia sob o nome de crescimento econômico, o dinheiro no centro da produção sem fim de bens e serviços, sua acumulação e sua distribuição por natureza ilegal.

A operação de salvamento consiste em instalar no lugar do lucro a todo preço o que nós cremos ser o centro de todo o desenvolvimento autêntico: a pessoa humana dentro de sua comunidade. Essa etapa é muito delicada, pois o dinheiro, o capital e o crescimento – todos interconectados – permanecem para os advogados do livre mercado o centro e o propósito do desenvolvimento. Pior: é até mesmo o nome da defesa do indivíduo que rejeitam toda interferência do Estado dentro dos negócios econômicos. Sem questão, para estes últimos, aceitar os salários mínimos ou o reconhecimento dos sindicatos... Sua teoria de desenvolvimento consiste em dizer que toda pessoa é livre de soçobrar ou nadar por ela mesma dentro do mar econômico, de ser sacudida dentro das agitações de oferta e demanda. O mercado “livre”, conforme esta interpretação, permite aos sortudos passar da pobreza à riqueza. Eles chamam essa teoria de a mão invisível da oferta e da demanda. Não esqueçamos, que essa mão, muito frequentemente, estrangula aqueles que ela supostamente emancipa.

O centro do verdadeiro desenvolvimento é outro: seu “coração” insubstituível deve ser da pessoa humana dentro de sua comunidade. Por fora de sua comunidade, o indivíduo não tem existência independente. Seu destino resulta desde seu nascimento, seguindo o fio de sua vida. Tomemos o exemplo do Sri Lanka. Um funcionário do Banco Mundial em Colombo aceitou encontrar um grupo de militantes muito críticos. O grupo exprimiu seu profundo desacordo com o conceito de desenvolvimento e sugeriu uma outra coisa. Eis aqui as grandes linhas.

Nutrir e sonhar: ter em conta as verdadeiras necessidades

As necessidades para prover as mais importantes, para um desenvolvimento digno do nome, são as necessidades dos pobres. O projeto de subsidiar e de controlar os preços dos produtos de primeira necessidade, a farinha e o açúcar, e de subsidiar sua compra pelo consumidor começou no Sri Lanka em dezembro de 1941. Com diferentes modificações, mas sempre com a idéia de que o dever do Estado é assegurar que ninguém padeça de fome, o projeto foi posto em prática até 1977, depois finalmente abandonado. Em seu lugar, um plano, mal administrado, de boa essência e alimento foi adotado para os pobres em 1977 e recebeu imediatamente um ataque de críticas. Conforme seus difamadores, o projeto era uma heresia econômica, uma imprudência financeiramente insuportável, uma festa de políticos populistas. Ou era o dever de um dirigente budista de assegurar que ninguém dentro do seu reino morresse de fome.

É indiscutível que o projeto foi estabelecido para aprimorar, afim de não distribuir aos “nantis” o arroz gratuito para nutrir apenas cachorros. Assim mesmo, teve-se que aplicar com mais rigor para que o projeto impedisse que várias famílias pobres da ilha morressem de fome.

Temos também o caso do hospital. Dentro do terceiro mundo, aqueles onde faltam frequentemente leitos, e os pacientes devem dormir abaixo das camas já ocupadas, de fora das salas ou sobre macas instaladas sobre balcões, algumas vezes próximos a esgoto e latas de lixo. A primeira taxa de serviço de saúde deve ser, com o nome de desenvolvimento, de equipar com camas todos os pacientes. Se tem um número insuficientes de lençóis e travesseiros e se, até mesmo depois de uma operação cirúrgica, os enfermos são instalados sobre colchões e travesseiros sujos, a prioridade do desenvolvimento é fornecer lençóis e travesseiros limpos.

Alguns meses antes de sua assassinato em 1948, Mahatma Gandhi, propôs um critério: “Quando você estiver em dúvida e você mesmo se obriga por demais, explica ele então, aplique o seguinte teste: recorde-se da face do homem mais pobre e mais frágil que você já encontrou e pergunte-se se o ato que você projetará para ele será útil. Você irá ganhar alguma coisa? Irá render o controle sobre sua própria vida e destino? Em outro termos, dará independência a milhões de pessoas famintas psiquicamente e espiritualmente? Então você verá suas dúvidas e você mesmo se dissipar” ( The Collected Works of Mahatma Gandhi, vol 89) Eis aqui o tipo de prioridades que necessitamos ter coragem de defender.

O pobre não deve ser a periferia do desenvolvimento

Todo programa de desenvolvimento deverá em seguida ter como objetivo a humanização da vida. É dentro da humanização que o desenvolvimento encontra sua mais alta expressão. Um desenvolvimento que encoraja o desejo de adquirir para seu próprio benefício, o o consumismo, o elitismo, a desigualdade econômica e social, é um anti-desenvolvimento. As pessoas devem possuir mais para serem mais, não para serem elas mesmos, dentro do isolamento, mas por todo a comunidade. A humaniza é este “ser mais”. Qualquer pessoa no planeta deve ser capaz de viver uma vida plenamente humana: comer, beber, dormir, dar e receber amor, sentir prazer ou sofrer em função de suas necessidades. Quando, no Sri Lanca, a família de um trabalhador agrícola – o pai, a mãe, os pais, as crianças solteiras ou recentemente casados – deve viver, comer, dormir e procriar em um espaço de 10x12, com um espaço 4 de cada 2 pés fechado por uma cortina fabricada com velhos saris, para um casal recentemente casado, a situação pode ser classificada de inumana.

Ninguém no mundo deveria ter fome, sede, ser sem abrigo e sem amor. Ninguém deveria ser indigente à ponto de não sentir nem alegria nem tristeza. Humanizar o desenvolvimento supõe-se colocar o pobre no coração do processo. É o que o Banco Mundial não tem compreendido. A “rede de segurança” que ele promove nos países onde intervem é um plano de ajuda, atribuído ao de conta-gotas e de má vontade, vencer desde que possível. Neste programa, os pobres não são coração do conceito de desenvolvimento. Estes últimos devem reagir e dizer: “Nós não temos o desejo de estar presos dentro de sua rede de segurança; queremos a justiça que a torna inútil”.

Se o desenvolvimento é a humanização, é fácil compreender, especialmente no terceiro mundo, que o desenvolvimento significa sobretudo liberação – liberação de qualquer que o desumanize. Se o Trabalho, representado pelos trabalhadores da agricultura e da indústria que construíram os monumentos da civilização, devem endireitar a cabeça com dignidade, o Capital, representado pelos financiadores, os proprietários das fábricas ou vastos domínios agrícolas, devem cessar de pesar sobre as costas dos trabalhadores. A humanização é impossível sem liberação.

O oposto do processo de liberação é o de alienação que é o resultado inevitável do modo capitalista do desenvolvimento. Contudo, é necessário reconhecer em qualquer liberdade que o capitalismo jogou um papel liberatório permitindo aos homens quebrar as cadeias que sujeitavam-no na época feudal pré-industrial.

Nessa época, ele tinha apenas um conhecimento imperfeito e frequentemente errôneo sobre as forças da natureza. Os homens eram submissos à estas forças e tinham pouco controle sobre elas. A Igreja e o Estado ensinavam então que a ordem social era de origem divina e que seria mal visto e em todo caso vão querer alterá-la. O capitalismo alterou tudo aquilo. Devolveu ao homem o ser plenamente responsável do seu destino. O problema é que ele trouxe outras formas de alienação, mais cruéis que aquelas do sistema feudal pré-industrial. É contra estas que devemos lutar.

A necessidade de mudança pode resultar de análise social exata ou de uma melhor tomada de consciência dos direitos de cada um e da injustiça de certas situações. Pode vir de uma interpretação radical da religião. Pode também resultar de uma revolução. Ela não implica obrigatoriamente o recurso à violência; mas não podemos excluir por princípio, porque o contrário do amor não é a revolução violenta, mas o ódio.

O objectivo final das atividades de desenvolvimento não é o que a maior parte doadores exigem. É o melhor ser ou a humanização. Desde as escolas maternas nas plantações, desde os programas de formação profissional para os mais pobres, dos programas de alojamentos para refugiados, não podem ser julgados satisfatórios unicamente porque eles atingem os seus objetivos imediatos, visíveis e quantificáveis, mas apenas na medida em que contribuem em uma maior felicidade. Se este objetivo final não é perseguido com obstinação e intensidade, a atividade de desenvolvimento não será somente neutra em relação a humanização da sociedade: será negativa.

Este caminho é difícil. Falhas são possíveis. As pessoas podem não ver construída cinqüenta das sessenta casas previstas. Um projecto de exploração avícola montada por um grupo de ação social em Kandy, no Sri Lanka, para reconciliar dois grupos étnicos violentamente antagônicos pode ser um desastre no ponto de vista financeiro ou de produção de ovos. Mas se as pessoas que construíram as casas ganharam em segurança e dignidade, se os criadores de aves aprenderam a trabalhar juntos, falar e rir juntos, a viver em conjunto e a ter confiança um no outro, o projeto pode ser socialmente um sucesso.

O retorno aos preceitos de Gandhi

O desenvolvimento autêntico é espiritual. Uma vez mais, Gandhi é indiscutível: “A civilização ocidental é material, abertamente material. Ela mede o progresso pelo progresso material […]. Ninguém diz "agora as pessoas são mais verdadeiras e mais modestas". Julgo-o as perto dos meus critérios e utilizo a palavra "satânico" para as descrever… Vocês fazem grande caso das coisas temporais, superficiais. A civilização oriental é por essência espiritual, imaterial. […] De acordo com vocês, quanto mais se tem, melhor é, e vocês realizam-se nesta crença.”(Ibid., Vol. 48)

A dimensão espiritual do desenvolvimento deveria orientar, impregnar e influenciar o interior de todas as outras dimensões do desenvolvimento. É ela que produz poetas, filósofos, músicos e artistas. É ela quem torna capaz o amor e o ódio, a devoção apaixonada por uma outra pessoa ou por uma causa. É ela que faz com que o ser humano possa exceder as fronteiras do que é visível e tangível para atingir o sentido mais profundo da vida humana. É ela que torna o homem humano.

A dimensão espiritual não é a dimensão religiosa, aquela que possa incluir. Recordo-me precisamente o dia em que, no início dos anos 80, visitava as famílias de Jaffna que tinham sofrido a repressão do Estado em resposta ao pedido dos Tamouls com respeito a seus direitos. Eu acompanhava um amigo singalês marxista. Acabávamos de visitar uma família afetada. Fomos os dois ao mesmo tempo entristecidos pelo que tínhamos visto e ficamos cansados mental e fisicamente. Quebrando o silêncio, perguntei-lhe : “Porque fazemos tudo isso, com tão pouco esperança de sucesso? Porque tomamos todos os riscos ? Porque vamos de casa em casa, para entender estas pessoas e ouvir o que elas suportaram ?” O meu amigo me disse: “porque nós somos humanos e eles são humanos.”

Deve-se procurar paz social e harmonia

Posto isto, não se pode duvidar que um bem estar econômico seja crucial. É necessário para ele mesmo e necessário para uma vida humana integral. O bem-estar econômico significa, toda a satisfação das necessidades básicas dos homens. As pessoas têm necessidade de uma boa alimentação, nutritiva, como se diz, aquilo que um nutricionista chama de um regime equilibrado em carboidratos, proteínas e lipídios. Eles possuem a necessidade de roupas em número suficiente, não somente para cobrir sua nudez, mas também para poder se vestir regularmente. Têm necessidade de um abrigo correto: uma casa ou até mesmo uma cabana.

Conheço pelo menos um trabalhador social que pensa que o alojamento deveria ser prioritário em relação ao alimento e os vestuários. Dêem um alojamento à uma família, diz ele, e a família fará que haja neste alojamento o suficiente de alimentos e de vestuários. Isto foi experimentado com efeito por Satyodaya, uma organização social em Kandy, no Sri Lanka, no seu plano para habitar setenta famílias deslocadas. É essencial que o desenvolvimento passe também pelos cuidados médicos e das escolas para as crianças. É essencial também um ambiente físico e social favorável socialização das pessoas na comunidade. Nada isto deveria ser ignorado, ainda menos negado.

Não podemos negar que as necessidades evoluem. É necessário contudo guardar do discernimento e fixar objetivos positivos para a comunidade. No Sri Lanka, o crescimento não pode ser autenticamente portador do desenvolvimento sem a condição de efetuar aos Cingalêses a maior estabilidade emocional. No contexto da diversidade étnica que existe no Sri LanKa, um desenvolvimento autêntico do país deveria conduzir a maior paz social, a confiança e a harmonia. Numa palavra, o crescimento econômico deveria fazer estourar os seus próprios parâmetros e conduzir maior felicidade ao mesmo tempo material e espiritual.

É necessário, para isso, liberar as energias. O “gênio dos pobres” vem da sua energia de criatividade e de resistência. Estas forças são ao mesmo tempo física e moral, mas mais moral que físicas. A força moral é promovida pela idéia de que o trabalho de uma pessoa é o seu trabalho, que este trabalho não é requisitado por outra pessoa, para o benefício de qualquer outro. Assim, o verdadeiro desenvolvimento fará que o fruto do trabalho dos homens leve a marca do que o produziu. O trabalhador que constrói ou reforma um pequeno tanque de água para irrigar os campos da sua aldeia é portador deste ponto de vista diferente do trabalhador que efetua um trabalho monótono cada dia para construir um enorme dique ou uma estação hidro-elétrica. Este trabalho é efetuado com desgosto, contra o coração, unicamente pelo salário que procura, enquanto que o primeiro, significa a vida para o trabalhador, a sua família, os seus pais e os seus amigos, para toda a aldeia, é efetuado na alegria e com certo sentido de plenitude.

Isto significa que não é necessário construir um dique ou uma central hidro-elétrica? De forma alguma. Significa apenas que o desenvolvimento deve definir prioridades, saber o que liberará melhor as forças morais e físicas das pessoas.

O desenvolvimento, por último, não deve comprometer o futuro. Este é o tendão de Aquiles do desenvolvimento ocidental. Arruinando o meio ambiente, esgotando recursos não renováveis, poluindo a atmosfera, se apropriando do trabalho e dos vastos mercados, das populações dos países em via de desenvolvimento, este tipo desenvolvimento breve, tem suas perdas. Um dia, os pretos, brancos e todos os povos do terceiro mundo se levantarão. Dirão: Basta! E isto poderia intervir mais cedo nós cremos.

Por Paul Caspersz

satyoda@eureka.lk

PS.: Tradução livre do Francês autorizada por Bernadette HUGER, Centre International Lebret – Irfed por João Baptista

sexta-feira, 6 de março de 2009

"Crise mundial alastra fome no mundo."

        Estive lendo esta entrevista e gostaria de compartilhar com os leitores do blog. Muito interessante e ótima para refletirmos sobre a postura do mercado hoje e o avanço do vácuo de desigualdades no mundo.

E a crise mundial que estamos vivendo irá agravar ainda mais essa situação dramática que arrisca se tornar sempre mais incontrolável”. Quem está convencida disso é Nancy Roman, diretora das comunicações e das políticas da informação do Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (WFP), que fala a respeito nesta entrevista concedida a Mario Ponzi, do L'Osservatore Romano, 06-03-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis a entrevista.